quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

De todos os dias ou quase.

Você está deitado de costas pra mim. Olho pro seu cabelo preto, espalhado no travesseiro e acho que é a coisa mais bonita desse mundo. Queria tirar uma foto, fazer um desenho, escrever um poema falando da sua pele morena. Você se vira e me assusta. Sorri com os olhos apertados, olhos de rio e tempestade. Depois de tanto tempo, o que vai lá dentro continua sendo, para mim, um mistério. Enquanto isso, brinco na superfície me fingindo distraída. Mas, entenda: não tenho medo de me afogar.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

A La Ursa quer dinheiro, que não der é pirangueiro.

Era uma praia de Porto de Galinhas sem turistas. Pelo chão de terra batida, lá vinha ela: a La Ursa. Gigantesca, mal encarada, monstro com olhos de gente. As pessoas batiam palmas e cantavam ao seu redor "a La Ursa quer dinheiro, quem não der é pirangueiro". Entravam nas casas, rodopiavam, dançavam, corriam atrás de um mal afortunado. Os adultos achavam graça. As crianças choravam. Eu ficava no terraço corajosa. O meu olhar atento seguia o bicho e ensaiava um sorriso pra disfarçar o pavor. Rezava pra que acabasse logo, pra que ela fosse embora, pra que ficasse longe de mim. E assim começava o meu Carnaval, sempre esse cavalo doido.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

6 dias.

Ela disse que queria voltar no tempo e ver como era antigamente. Os trilhos do bonde e as pedras do calçamento, continuam lá. No tapume que esconde o velho armazém, imagens de uma cidade futura, inimaginável. Do outro lado, o antigo casario, imutável. O que se ouve é uma mistura de frevo e maracatu. O resultado é a desarmonia. Plumas, paetês e as flores coloridas da chita. Tudo me comove e me convence: é Carnaval e a minha cabeça dói terrivelmente. O que me salva é ver o menino bonito dançando para os orixás. Os tambores do afoxé, anunciam: a guerra está para começar, escolham as suas armas.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Café, pão doce e a minha avó.

E o perfume que o vento trouxe, me fez lembrar das tardes de antigamente. Café e pão doce. A minha avó. E alguém que tinha vindo conversar com ela - sempre vinha alguém conversar com ela - mas, já ia embora porque tava escurecendo. A hora do lusco-fusco. Quando o coração aperta e o que se sente é nostalgia. Rosa, roxo e azul, azul tão escuro que parece preto. A minha mãe demorava a chegar. O meu pai demorava a chegar. Mas, tinha a minha avó, amor, café e pão doce. Tinha a rede na varanda. Onde eu deitava de bruços e me distraia olhando as formigas. Depois, me distraia olhando as estrelas. Até lembrar do possível disco-voador. Tinha medo de disco-voador. Tinha medo de um monte de coisas. A noite me doía. Sempre preferi as manhãs.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

É noite.

E o seu silêncio toma conta da casa, que é sua. Ouço a televisão, o violão, o jogo chato. Sei que você está. Mesmo em silêncio, porque o seu silêncio é imenso. Uma sombra que chega até o quarto de onde escapo para o mundo. Até que você se aproxima, arisco feito um gato. Eu caço o seu sorriso, como se dele dependesse o meu. Fácil.