quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Eu não me movi.

Eu mal respirei. Contei até 10, 100, 1.000. Continuei no meu lugar e estar no meu lugar, cansa. Tive impressões de vôo. Tive malas prontas, aeroportos e aviões. Mas, voltei. Eu sempre volto. O tempo voa e não passa. Um pouco diferente ainda é muito igual.

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Amigo-taxista

Olhe, essas clínicas só fazem atrapalhar o trânsito do Recife. Tudo atrapalha o trânsito do Recife. Mas, ô povo pra fazer exame, viu? Faz exame todo dia. Tem cliente que eu levo toda semana pra fazer exame. E resolve? Resolve nada. Morre tudinho. Morre de todo jeito. Eu não sei nem a cor de médico. Médico já veio falar besteira pro meu lado e eu disse: "doutor, se médico resolvesse algum problema, médico não morria". Mas, morre, não morre? Num instante ele se calou. Mas, não é verdade? Médico morre! Todo mundo morre. Aí, o pessoal fica aí, tudo fazendo exame e é tudo podre por dentro. Tudo com essas doenças pesadas. Hoje, mesmo, eu tava ali comendo pão com bacalhau. Salgadinho, uma delícia. E o pessoal come? Come não. Pode não. É tudo podre por dentro. E ficam me dizendo: "tu vai comer isso, rapaz?", eu como é de tudo! Pão com bacalhau, salgado ainda. Agora, tem gente que gosta de roupa de marca, relógio de marca... Eu não. Faço questão disso, não. Mas, comer, eu quero comer o que eu quero. Vou na feira logo cedo, compro o peixe novinho, levo pra casa, dou um grau. Faço no coco... Roupa não, eu visto qualquer coisa. Tem gente que anda só com roupa de marca e passa fome. Shopping mesmo, eu nunca fui. Eu não vou comprar nada mesmo, é um negócio só pra dar água na boca do sujeito. Quando a lua tá grande, ficam aqueles barquinhos ali, já viu? Ficam ali pegando siri mole. Eu vou lá e pego logo um balde. É 30 reais. Eu dou 30 reais. Siri mole, bem molinho. Afe Maria, chega tô me lembrando. As patas ficam tudo assim se trocando. Tudo molinha. A senhora sabia que essas sardinha que vem assim... essas sardinha era comida de pobre? Era! Agora não. Fazem até prato fino. Resultado, ficou caro. Feito bacalhau. Bacalhau era comida de pobre. O pessoal chega ficava mangando quando sentia o cheiro... Mas, agora, bacalhau é comida de rico. O quilo 27,99. 28 reais. Queijo do reino. Queijo do reino é o queijo que eu mais gosto. A marca boa é borboleta. Bota assim na geladeira, chega fica resseco. Teve uma vez que eu tava com um cliente de Cuiabá, Cuiabá, por ali, aquelas áreas. Tava ele e a mulher, que ele vinha trabalhar, mas vinha passear também, né? Ir pra praia... Aí, no último dia, eu ofereci a ele comprar bolo de rolo ali na Casa dos Frios. Rapaz, ele ficou doido. Comprou uns sete, oito bolo de rolo. Quando ia embora, me deu uma sacola e disse: "esse queijo é pro senhor tomar uma". Eu agradeci, botei aí no carro e pronto. De noite, cheguei em casa e falei pra mulher: "mulher, pega ali o queijo que eu vou tomar uma ali na venda". Quando ela pegou, disse: "não, esse queijo aqui, tu não vai levar não. Tu sabe quanto foi esse queijo? 170 reais". 170 reais, um jeito assim de casca grossa, marrom, com uns buracos. Sabe qual é? Pronto, é esse! Eu pensando, pronto, ganhei o queijo e é a mulher que manda. Ela disse pra eu levar queijo de coalho mesmo... Eu disse "tá certo, deixa esse queijo aí pra gente tomar café". 170 reais, um queijo. Já pensasse? Agora, bom viu? Pizza, eu também gosto de fazer. Massa fina. Não é essa massa grossa que venda nas pizzarias não! Nas pizzarias, eles passam só um pincel de molho e queijo. É só massa. O meu, eu pego pão novinho, pego um copo americano, espalho na forma, massa fina e faço uma portuguesa que não tem igual. Minha filha até diz: "pai, o senhor devia botar uma pizzaria". Mas, uma pizza dessa que eu faço, o povo não ia querer pagar, porque o povo quer pagar só 10 reais. Pizza de borracha, uma lapa de massa, 10 reais. A minha portuguesa vão querer pagar a mesma coisa. Vai ser prejuízo.

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Depois da tormenta, silêncio.

Um alívio. Meu sossego. Uma benção. Portas e janelas abertas para o sol entrar. O sol e o vento, que corre livre pela casa. Tudo que ouço, tudo que quero ouvir é o som da minha respiração. Hoje, o meu universo sou eu. Giro ao meu redor e danço. Danço esse silêncio e não há canção mais bonita.

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Amigo taxista.

Eita, Boa Viagem... A senhora escolheu a pior hora. Olhe, eu só vejo piora nesse trânsito. E nem pense que vai melhorar, porque não vai. Lá em Suape mesmo, tem não sei quantos carros, tudo num navio, esperando pra desembarcar. E não pode demorar muito no navio não, viu? Porque o navio paga o tempo que passa no porto, sabia? Eeeeeé, feito avião. Avião também paga ao Aeroporto. Se atrasar 10 minutos, paga é muito dinheiro. E, olhe, essa semana roubaram a minha carteira de motorista. Quer dizer, roubaram não, furtaram, que foi dentro do carro. Aí, eu tive que ir lá no Detran e o que tem de gente, de jovem tirando carteira, minha amiga, não é brincadeira! Fora o pessoal motorista de ônibus, de táxi, de caminhão, tudo cheio de multa... Minha mulher foi lá no Detran e disse que o que mais tinha era esse pessoal... A senhora dirige? Por que? Gosta não? Ah, a minha esposa é o seu contrário. Ela é doida pra dirigir, tá fazendo auto-escola. Mas, eu vou lhe dizer uma coisa: esse pessoal de auto-escola só ensina a fazer prova, porque a dirigir não ensina é nada. Coloquei ela no carro pra ver e depois eu disse: "minha filha, você ainda tem que aprender e é muito!" Mas é afoita, ela. Tem medo não. E tem muita vontade de dirigir. E vontade já é 60%. Aí, ela tem essas duas vantagens, né? Quer e não tem medo. Vai pelo meio dos carros, nem parece. Quer tirar carteira. E precisa. No trabalho dela tem que dirigir carro ou moto. Mas, ela é nova e quando a pessoa é nova aprende logo. Tem 27 anos. Eu, tenho 43. Olhe, a senhora tá dando sorte, viu? Tá até andando. Quero ver é quando chegar ali naquele shopping novo. A senhora já foi no shopping novo? Já? Pois, olhe, sabe quando é que eu vou entrar lá? Nunca! Não sei se a senhora soube, mas a inauguração foi a coisa mais desorganizada do mundo! Não tinham organizado o trânsito, não tinham organizado lá dentro, 25% das lojas estavam ainda fechadas... Agora, sabe por que isso? Porque esse homem não é bobo, minha filha! Marcou uma data e pronto, quis nem saber! E os lojistas que pagaram uma fortuna pra estar ali, tiveram que abrir de todo jeito! Quem não conseguiu, se lascou. Minha mulher foi lá na inauguração. A senhora foi na inauguração? Ainda bem! Na parte da comida, tinha refrigerante quente, sanduíche frio e você só podia pagar em dinheiro e dinheiro trocado! Cartão não pegava. Mas, tinha que abrir, né? Que esse homem não é bobo. Ele, esse Batista... Homem assim é muito inteligente! Pra ganhar esse dinheiro todo tem que ser muito inteligente e inteligente de saber ganhar dinheiro, que é diferente. A senhora já viu o prédio dele? É uma lapa de prédio. E é tudo escritório dele, viu? Não é outra coisa não! É um prédio todinho só de escritório dele. É a central. Mas, lá dentro do shopping eu soube que é lindo! Minha mulher disse. Mas, por mim, não vou lá é nunca. E imagine agora que vai chegar o Natal! E esse trânsito, como é que não vai ficar, hein? Meu Deus! Coisa de doido. Mas, a senhora vê assim, vê esse trânsito, esses carros tudinho e pensa que eu me incomodo? Me incomodo não. Eu não sinto é nada. É que eu já trabalhei em São Paulo. 12 anos. Trabalhei lá como motorista. Motorista de segurança, motorista de senhoras, motorista de ônibus, motorista de caminhão. Tinha um amigo meu que dizia: "lá na tua terra é tudo na peixeira" e eu respondia que muito pior era em São Paulo. Aqui, a gente ainda espera, ainda dá a vez pra alguém passar. Lá não. Minha patroa mesmo disse: "olhe, aqui você tem que fazer tudo certo, tudo com coerência, mas não pode ser bobo". Lá é assim, colocou a cara do carro, vá. Não espere não, que ninguém vai lhe dar a vez. Eu ganhei um dinheiro lá. Trabalhei num ônibus que era bem dizer um cassino. Tinha jogo, dois andares... Agora, eu trabalhava muito. Mas, ganhava muito também. Trabalhava e ganhava. De gorjeta. Parava assim, numa churrascaria e eu procurava logo o responsável e dizia: "tem 64 pessoas pra almoçar aqui e então?", ele respondia: "a gente dá o seu almoço, o almoço do seu parceiro e mais uma porcetagem aí". Resultado, saia com 200, 300 reais. Uma boladinha! Tanto é que chegava o fim do mês e eu nem olhava meu salário. Dizia: "deixe aí, que eu tô me virando com as gorjetas". E ainda tinha as diárias, que a empresa dava. Mas, o pessoal sabia que motorista desenrolado tira o seu por fora. Pensão era a mesma coisa. O pacote não tinha hotel? Eu arranjava uma pensão e quando ia embora, a dona já chegava com o dinheiro pra mim. Tinha gente que queria quarto normal, quarto com ar-condicionado e tudo isso eu ganhava. Só que fechou. Deu não. A senhora tá vendo que eu só vou pela faixa que anda mais, né? A pessoa tem que ser assim como eu. O trânsito tá ruim, mas tem muito motorista ruim também. O jeito é ir se virando. Por exemplo: atrás de ônibus não anda, atrás de caminhão não anda, atrás de mulher se arrumando não anda até ela terminar o salão dela, atrás de velhinho dirigindo não anda e se apitar ele fica logo nervoso, atrás de fusca não anda. Tem que ir reparando, analisando essas coisas. Senão, fica parado. Eu vejo assim uma faixa, vejo outra e vou só me ligando. Tá vendo que nenhum carro passou o sinal amarelo? É que tem uma câmera bem atrás da senhora. Numa casinha. A gente chama casa de pombo. Só pra multar. O pessoal já sabe e para. Se tiver no meio do caminho, o cara vai. Mas, se fechar e ainda tiver do lado de cá, não adianta, que não dá tempo. É multa! Agora, moto tem demais, né, não? Olhe de cada 10 motoqueiros, tem 01 responsável. Meu filho tem moto. E eu disse a ele "filho, eu lhe dou tudo, dou até a roupa do meu couro e fico nu, mas pra essa sua moto não dou é nada". Mas, ele foi lá e comprou. Menino bom danado. 23 anos. Uma benção. Não bebe, não joga, não dança. Só é muito namorador. Mas, é da idade dele. E um rapaz bonito, alto. Agora, ele comprou uma de 300, que ele é de cilindrada. E ainda não é a que ele quer! A que ele quer mesmo é de 600... Eu fico é preocupado. Hoje mesmo, eu vi três mortes só de moto. É muita morte, minha senhora. Eu tava era contente que meu filho tava no exército, achei que ela ia seguir carreira, mas ele disse que era muita gente pra mandar e pouca pra obedecer. Eu queria que ele ficasse ou tivesse um trabalhinho certo, folgando sábado e domingo. Mas, ele agora inventou de ser taxista. Acho que foi porque eu disse a ele que sair do exercíto não adiantava, porque quem tem chefe tem general...

passa, mas fica.

sempre que ele descia as escadas para me abrir a porta, era um baque no coração. tum-dum! um susto. um desmantelo. um quase aperreio, só que bom. aí, tinha aquela casa grande demais. o sofá, o violão, a grade da varanda. as pessoas indo e vindo, a gente indo e vindo. falta de estar em. falta de estar sós. falta de tempo de ser e de aprender o outro. vrummm! um baque. um susto. um desmantelo. um quase aperreio, ruim que só.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Deve ser essa casa.

O piso de madeira, as paredes de cor-nenhuma, os azulejos. Deve ser essa casa, as portas e janelas pesadas. O jardim sem flor. A nesga de céu que se avista. Deve ser essa casa e os seus metros quadrados cansados. Parêntese no tempo e no espaço. Teia de aranha, poeira e cupim. Antigo mal disfarçado. O ar denso, tenso. A dificuldade de respirar. A rotina esmagadora dos dias.

Eu não sei escrever.

Se soubesse, lhe escreveria uma carta. Uma carta comprida, em papel pautado. Eu lhe escreveria uma carta com a letra mais bonita. Feito caderno de caligrafia. Talvez, lhe desenhasse um coração. Um coração traspassado por uma flecha. As nossas iniciais. Isso é romântico. Eu não sou romântico, nem sei escrever, mas ainda posso lhe mandar flores.

sábado, 10 de novembro de 2012

Doida, só pode.

Risca paredes, bate portas, deixa o telefone tocar. Uma, duas, dez vezes. Grita e diz que a culpa é minha. Há culpa. Há angústia e esse aperto no peito. Deita na cama e olha para o teto. Às vezes, canta. Inventa uma dança. Assanha o cabelo e vai pra rua. Da varanda acompanho os seus passos. Olha porque me sabe e sorri, xeque-mate. Fecho as janelas, abaixo as persianas, apago as luzes. Por favor, não volte. Volta. O seu perfume se perdeu no caminho. Cheira a cigarro e cerveja. Adivinho o seu Carnaval. Mas, amanhã, querida, é quarta-feira de cinzas.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Agora é, mas já passou.

O cheiro de terra molhada e o sol da manhã, quase tarde, refletido nas poças d’ água. Pétalas amarelas de uma flor muito pequena nessa lembrança que acontece agora. Meus pés tocam o asfalto ao meio dia, mas meu coração vive horas antigas. Um instante e já passou. Momento é sopro.

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Em algum momento,

A gente fala sozinho. Aqueles cinco minutos em que o mundo se distrai. Bem na hora da piada, da pergunta, da confissão. O Outro olha pro lado errado. Depois, vira e pergunta o que foi que a gente disse. Quando percebe que a gente disse alguma coisa. Mas, o sentido se perdeu. O sentido das coisas é muito passageiro. Foi. Agora, é. Depois, já não é mais.

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Desse susto que sempre é.

O coração acelera e o tempo para. Vácuo. É bem aí que me encontro. Não entendo e desespero. Não respiro. Morro antes, bem antes do fim. Não vejo, não ouço, não falo. O movimento é feito por instinto e não por vontade. Queria era parar. Parar o que dentro de mim é reboliço. Mas, não sossego. O contrário do alívio é esse cansaço.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

Caminho e me acredito forte.

Nada me detém. Nem o que me alegra, nem o que me arrebenta. Sou um trator e não olho mais para trás. Ou olho. Rápido e de soslaio, que é para não tropeçar. Ainda tenho um medo maior que eu mesma. Um monstro embaixo da cama. Mas, me acredito forte e nada me detém. Sou um rio e corro apressada. Já não sinto tão intenso, mas continuo passando mal na sala de espera do consultório médico. Sou frágil, mas sou forte. Não durmo, não fecho os olhos, não me distraio. Presto muita atenção e percebo mais do que pode parecer. Sou forte, sou fio desencapado. Pareço inofensiva, mas é preciso ter cuidado ao me tocar.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Em silêncio.

Ontem, o seu nome não me disse nada. Era só uma palavra. Sem amor, nem dor. Fui mais feliz. Livre, até. Sem o peso do “como seria se”, que estraga o hoje da gente.

sexta-feira, 18 de maio de 2012

Dessa conversa que não tem fim.

Se esse diálogo fosse uma dança, descompasso. Tento dois pra lá, dois pra cá e você insiste em um pra cada lado. Hoje, meu ritmo é o riso. Mas, você dói. Há o desencontro e o desentendimento de quem vê no outro a si mesmo, mas tão diferente. Danço com o espelho, estilhaçado. Ou estilhaçada estou eu.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Áries com ascendente em peixes

O corpo ainda quente de sol. Cheiro de cerveja e maresia. Teu olho cheio de cores. E esse riso, essa voz, essa música que enchiam a casa. E a vida. Como falar em saudade, se saudade só existe em português? Mas, você me entende em qualquer língua. Já eu, eu não entendo coisa nenhuma. Sou esse impulso, que não mede conseqüências. E choro depois, sozinha.

segunda-feira, 23 de abril de 2012

Posso chamar esse hiato de distância.

Ou de silêncio. Tudo que afasta, tudo que separa. Essa sombra crescendo entre a gente. Atravesso o rio, insisto, nado contra à correnteza. Arrebento a alma. Caminho sobre brasas e em meus olhos, lágrimas. Toda dor é imensa, é insana. Cega como a fé, essa faca afiada.

domingo, 22 de abril de 2012

Estar em casa, pertencer à.

Esse chão e esse cheiro reconheço como meus. Essas cores salpicadas nas paredes são suas. Durmo e sonho amarelo. Os passarinhos acordam cedo com a gente. Chão frio e espirro. Café, pão e manteiga. Conversa solta, leve. Do riso à gargalhada, um suspiro. Novamente, o mar quebra nas pedras. Dessa vez, sem sustos. O tempo não passa e passa depressa demais. Não preciso te pedir pra ficar, porque sei que você volta. Eu espero e recebo. A isso chamo de entrega: de todas as escolhas possíveis, você.

sábado, 14 de abril de 2012

Teu amor, que é meu.

Teu amor é chão. É pouso, morada. Teu amor, minha pátria. Território de nós dois. Teu amor é alento. É um tipo de benção. Teu amor, mesmo mudo. Teu amor, minha casa. Teu amor que me salva. Do medo, do mundo. Teu amor que alivia, a alma. Teu amor, gargallhada. Teu amor, meu sossego. Essa cama em que me deito. Teu amor, meu espelho. Teu amor, olhos negros. Teu amor, sereno, moreno.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Que palavra é você?

Das mais bonitas às mais doloridas, não encontro a que lhe caiba. Preciso de uma palavra que lhe descreva, de uma palavra que lhe pertença. Preciso de uma palavra insone, de uma palavra que silencie. Preciso de uma palavra que seja fome, mas que também seja afeto. Preciso de uma palavra que morda, mas também que sopre. Preciso de uma palavra que não se deixe levar por meus pronomes possessivos mas que, ainda assim, seja minha.

Dona Francisca, Iracema.

Pra mim, ela era a índia Iracema das Fortalezas. Velhinha já, porque essa história foi escrita faz é tempo. E mesmo os anos, 93, não lhe tiraram a beleza. Se podia adivinhar. No corpo, nos cabelos, no olhar. Olhar de criança, que ria triste. Mas, ria. E fazia pose pra tirar foto e pedia coca-cola mesmo sem poder e não tinha medo de avião e contava histórias de antigamente e cantava de saudade. A saudade hoje é dela e eu não sei cantar tão bonito. Mas aos pés de um coqueiro no Ceará, que ninguém sabe direito onde é que fica, se ouve um lamento de despedida. Ela atravessa o mar para chegar a esse rio que é dela. É lá que mora o estrangeiro, aquele que lhe espera, aquele que sempre lhe esperou.

terça-feira, 10 de abril de 2012

Hoje, eu queria ser a menina no celular.

A menina no celular com Camila. Calça e blusa pretas. Bolsa descombinando e um cabelo tão bonito que merecia uma foto. Eu queria ser a menina no celular falando sobre a viagem, o salão, o beijo, a festa. Eu queria ser a menina com toda a sua despreocupação. Rindo em silêncio e balançando os ombros. Eu queria ser a menina no celular com a sua pele morena, os seus olhos miudos e as suas mãos de criança. E o cabelo bonito, tão bonito que merecia uma foto. Tchau, Camila, um beijo.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Eu olho pra você devagar.

Divago, enquanto você dança. Enquanto você dança, o tempo não passa. E é sempre noite. E é sempre música. Eu finjo que não ouço, mas o meu coração tiquetaqueia no mesmo ritmo. Fecho os olhos e sorrio imenso. Você nem desconfia, confia em mim. Mas, eu não presto. Peço desculpas. Sem sentir culpa alguma.

domingo, 18 de março de 2012

Domingo.

Anoiteceu, mas o calor do sol permanece. Na pele, no ar e nas paredes dessa casa. O cansaço aquieta o corpo, mas o coração não. Nem a mente, essa aranha que trama e tece. Fios invisíveis presos na garganda e nem toda água do mundo. O que salva é esse cheiro de maresia. O que salva é enterrar os pés na areia e ser árvore.

quinta-feira, 1 de março de 2012

Esquece o medo, engole o choro.

Disso não se fala. Se conseguir, nem pensa. Não consigo e sofro. Mas, me distraio com a correria do dia, a graça das pessoas, o caminho errado e a pressa em chegar. Ouço meu nome, sorrio como se tudo bem, sempre sorrio como se tudo bem. O velho olha pra mim sem parar, a moça com o namorado faz manha. Também queria fazer manha, mas ando muito cansada. O Por Enquanto me salva. É tudo que tenho, tudo que todo mundo tem, mas penso que é só comigo. O machado sobre a cabeça. O tempo, o tempo. Alivia, mas também machuca. Olha pra mim, eu olho de volta, meus olhos ardem, mas não me importo, nada mais importa. Agora.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

De todos os dias ou quase.

Você está deitado de costas pra mim. Olho pro seu cabelo preto, espalhado no travesseiro e acho que é a coisa mais bonita desse mundo. Queria tirar uma foto, fazer um desenho, escrever um poema falando da sua pele morena. Você se vira e me assusta. Sorri com os olhos apertados, olhos de rio e tempestade. Depois de tanto tempo, o que vai lá dentro continua sendo, para mim, um mistério. Enquanto isso, brinco na superfície me fingindo distraída. Mas, entenda: não tenho medo de me afogar.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

A La Ursa quer dinheiro, que não der é pirangueiro.

Era uma praia de Porto de Galinhas sem turistas. Pelo chão de terra batida, lá vinha ela: a La Ursa. Gigantesca, mal encarada, monstro com olhos de gente. As pessoas batiam palmas e cantavam ao seu redor "a La Ursa quer dinheiro, quem não der é pirangueiro". Entravam nas casas, rodopiavam, dançavam, corriam atrás de um mal afortunado. Os adultos achavam graça. As crianças choravam. Eu ficava no terraço corajosa. O meu olhar atento seguia o bicho e ensaiava um sorriso pra disfarçar o pavor. Rezava pra que acabasse logo, pra que ela fosse embora, pra que ficasse longe de mim. E assim começava o meu Carnaval, sempre esse cavalo doido.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

6 dias.

Ela disse que queria voltar no tempo e ver como era antigamente. Os trilhos do bonde e as pedras do calçamento, continuam lá. No tapume que esconde o velho armazém, imagens de uma cidade futura, inimaginável. Do outro lado, o antigo casario, imutável. O que se ouve é uma mistura de frevo e maracatu. O resultado é a desarmonia. Plumas, paetês e as flores coloridas da chita. Tudo me comove e me convence: é Carnaval e a minha cabeça dói terrivelmente. O que me salva é ver o menino bonito dançando para os orixás. Os tambores do afoxé, anunciam: a guerra está para começar, escolham as suas armas.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Café, pão doce e a minha avó.

E o perfume que o vento trouxe, me fez lembrar das tardes de antigamente. Café e pão doce. A minha avó. E alguém que tinha vindo conversar com ela - sempre vinha alguém conversar com ela - mas, já ia embora porque tava escurecendo. A hora do lusco-fusco. Quando o coração aperta e o que se sente é nostalgia. Rosa, roxo e azul, azul tão escuro que parece preto. A minha mãe demorava a chegar. O meu pai demorava a chegar. Mas, tinha a minha avó, amor, café e pão doce. Tinha a rede na varanda. Onde eu deitava de bruços e me distraia olhando as formigas. Depois, me distraia olhando as estrelas. Até lembrar do possível disco-voador. Tinha medo de disco-voador. Tinha medo de um monte de coisas. A noite me doía. Sempre preferi as manhãs.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

É noite.

E o seu silêncio toma conta da casa, que é sua. Ouço a televisão, o violão, o jogo chato. Sei que você está. Mesmo em silêncio, porque o seu silêncio é imenso. Uma sombra que chega até o quarto de onde escapo para o mundo. Até que você se aproxima, arisco feito um gato. Eu caço o seu sorriso, como se dele dependesse o meu. Fácil.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Ainda não vi essa fotografia.

Essa em que você aparece de vestido branco e cabelo solto. Essa de quando o seu cabelo ainda era comprido, ainda era castanho, ainda era cacheado. Quantos anos você tinha? 13, 14? Você com pés descalços na areia. Os pés grandes demais pro resto do corpo. “Como é franzina essa menina”, lembra? Uma promessa de mulher. O vestido branco dançava ao seu redor e você sorria na fotografia. Essa que eu ainda não vi.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

O teu nome.

Ranger de dentes em noite escura. O barulho do mar quebrando. Quebranto. Reza pra Nossa Senhora, minha filha. Um terço inteiro. Enquanto esse nó no peito, desata. Falta o ar, mas deve ser o calor. Faz muito calor, mesmo quando chove. E chove. Chuva de janeiro. Chuva que vem forte e vai embora, feito esse pensamento. Intrometido.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

O meu bom dia abusado.

O chão de madeira sob o sol, sobre a cidade. O chão de madeira esquenta. Da luz que entra pela janela, poeira. Ouço o barulho na cozinha. É você. O barulho na cozinha, os recados na geladeira, o cheiro de café e pão torrado. O piso alaranjado é feio. As cerâmicas de duas cores, desequilibram. Mas você, de tanto sol, amorenou. Eu reparo. Paro e acho bonito. Esqueço de fechar a torneira da pia, enquanto lavo os pratos e ouço a sua voz de sono reclamar: “olha a água do mundo”. O meu bom dia abusado.