segunda-feira, 29 de agosto de 2016



Ele me viu quando gritei de raiva abraçando o travesseiro. Chorando aquela dor profunda, que deixa a gente sem fôlego, sem força e sem chão. Ele me viu vomitar por não aguentar sentir tanto. Ele me viu e tocou cada marca que carrego no corpo, na alma e no coração. Com curiosidade e ternura. E me mostrou a mim mesma num espelho absurdo. E me fez mergulhar no que tinha de mais turvo e profundo. Ele me viu exausta de tanta realidade e soube que precisava de mais poesia nessa vida. Ele me viu perdida, levando comigo uma bússola que não funciona. Procurando uma saída, que talvez não haja. Ele viu o meu medo de nunca ser o bastante. Ou de sempre ser demais. Ele me viu tão sem medida, tão sem meio-termo, tão sem meio-tom. Ele me viu partida, tentando juntar as peças de um quebra-cabeças de peças trocadas. Ele me viu e eu sustentei o olhar. Nunca fui tão corajosa e ele me viu. 

sábado, 6 de agosto de 2016

O que você está dizendo?

O que você está dizendo? Ouço a sua voz e desconcentro. Sei que você procura um sentido. Sei que você preocupa um sentido. E pra mim, palavras soltas. Aqui e ali, uma luz, um brilho, um entendimento. Mas, meu entendimento tem pouco a ver com a sua explicação. Só adivinho. Só suponho. Pura intuição, sem qualquer base de razão. Razão, aliás, desconheço. Penso em amarelo. Penso em girassóis. Penso naquele pôr do sol rosa e lilás e de caminhar pela cidade sem fim. Palavras, carros, prédios, desce, sobe, vira, passos apressados. Segura a minha mão pra atravessar a rua. Segura a minha mão e não fala mais nada não, por favor. Mas, não falo nada. Não peço nada. Só rio. Sorrio e disfarço. E olho pras pessoas, me distraio com as pessoas. Apressadas. Porque sempre há pressa. A minha única pressa é de compreensão. Mas, compreensão é sempre lenta. Lenta como a sua voz, que tem música, maciez, riso e rouquidão. Mil histórias. Mil nadas desfilando no meu ouvindo, no meu pensamento. O que você está dizendo? Você está dizendo alguma coisa ou é só um disfarce pro silêncio. Penso. E calo. Porque quem fala é você. O quê? Eu não sei. Nem sei se saberei.